No dia 25 de maio alguém ligou para o 911 (o equivalente norte-americano do 190) para reportar que um homem tinha usado uma nota de 20 dólares falsificada na loja Cup Food, na Avenida Chicago, em Minneapolis. O processo 27-CR-20-12646 opõe o Estado norte-americano a Derek Chauvin, o policial acusado de matar George Floyd, o afroamericano cuja morte deu origem a uma onda de protestos nos Estados Unidos.
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Na descrição dos acontecimentos do início da noite de 25 de maio não está indicada a hora da chamada para o número das emergências, mas é possível correr a fita do tempo desde que os primeiros agentes da polícia chegaram ao carro onde estava George Floyd, até à chegada dos paramédicos — quando já estava sem pulsação. Foram 19 minutos.
20:08
Dois polícias vão até ao carro de Floyd
E Derek Chauvin nem sequer foi dos primeiros agentes a chegar a Floyd. Depois de terem recebido a denúncia de que um homem tinha usado uma nota falsa de 20 dólares e que estaria dentro de um carro estacionado na esquina da avenida onde se situa a loja, os agentes Thomas Lane e J. A. Kueng ativaram as câmaras de corpo, às 20:08 horas, e correram em direção à esquina onde estaria estacionado o carro.
Segundo as imagens dessas câmaras, visualizadas pelo Departamento de Apreensão Criminal do Minnesota, os agentes abordaram o carro, com Thomas Lane do lado do condutor e J. A. Kueng do lado do passageiro. Além de George Floyd, no carro estavam mais duas pessoas; Floyd estava no lugar do condutor, um homem adulto no lugar do passageiro e ainda uma mulher no banco de trás. O agente Lane começa a falar com Floyd e saca da arma, apontando-a diretamente ao condutor do carro, através da janela aberta, ordenou-lhe que ‘mostrasse as mãos’. Segundo o processo, assim que Floyd colocou as mãos no volante, o agente Lane guardou a arma no coldre.
Enquanto o agente Kueng falava com o passageiro no banco da frente, Lane pediu a Floyd que saísse do carro. Antes que Floyd saísse, Lane colocou as mãos em George Floyd e puxou-o para fora do carro, algemando-o. Já depois de algemado, George Floyd caminhou com o agente Lane para o passeio e sentou-se no chão, perto do agente Lane. “Quando Floyd se sentou disse ‘obrigado’ e estava calmo”, pode ler-se no processo, um documento que indica ainda que ambos tiveram uma conversa que durou menos de dois minutos. O suficiente para que o agente lhe pedisse a identificação, lhe perguntasse se estava “sob efeito de alguma coisa”, ou substância – já que notou que George Floyd tinha “espuma nos cantos da boca” – e explicasse que estava a ser detido por ter transacionado moeda falsa.
20:14
Polícias tentam colocar Floyd na viatura policial
Passaram-se seis minutos. São agora 20:14 horas. Os agentes Kueng e Lanestood tentam levar George Floyd para o carro da polícia. Enquanto os polícias tentavam colocar Floyd no carro, ele “enrijeceu [o corpo] e caiu no chão”. Floyd disse aos polícias que “não estava a resistir, mas que não queria entrar para o banco de trás porque era claustrofóbico”.
Derek Chauvin chega acompanhado por Tou Thao, já depois de dois agentes terem tentado sentar Floyd no banco de trás do carro da polícia
É depois deste momento que Derek Chauvin chega ao local, acompanhado pelo agente Tou Thao, noutro carro de polícia. Segundo o processo, os agentes fizeram “várias tentativas” para colocar Floyd no banco de trás no carro, empurrando-o a partir do banco do condutor. E antes mesmo de estar no chão, conforme as imagens gravadas por quem passava naquele momento na rua, George Floyd começa a queixar-se que não consegue respirar. “Enquanto os agentes estavam a tentar forçar Floyd a sentar-se no banco de trás, Floyd repetidamente diz que não consegue respirar”, lê-se no processo. George Floyd não se sentou voluntariamente no banco traseiro do carro-patrulha e os agentes lutaram para conseguir sentá-lo na parte de trás do veículo.
20:19
Floyd é colocado no chão, de bruços
Enquanto estavam a tentar que George Floyd se sentasse no banco de trás, Derek Chauvin toca pela primeira vez em Floyd, em conjunto com os agentes Lane e Kuengassisted, puxando-o a partir do banco do passageiro. Às 20:19 horas, o agente Chauvin tira Floyd do carro e coloca-o deitado no chão, de bruços e ainda algemado. O agente Kueng segurou as costas de Floyd e o agente Lane as pernas. É nessa altura que Derek Chauvin coloca “o joelho esquerdo na área da cabeça e pescoço de Floyd”, segundo descreve o processo. “Floyd diz: ‘Não consigo respirar’ várias vezes e repete ‘mamã’ e ‘por favor’, também”, detalha o processo que está no Tribunal Distrital de Hennepin, em Minneapolis.
Câmaras de corpo dos agentes registam Floyd dizendo “estou prestes a morrer”
“A determinado momento Floyd diz ‘estou prestes a morrer’”, segundo aquilo que as câmaras dos polícias no local registaram, mas Derek Chauvin e os outros dois polícias “mantiveram as posições”, tendo um deles respondido a Floyd: “Estás a falar sem problema” enquanto este se mexia para a “frente e para trás”. Nessa altura, o agente Lane pergunta “devemos colocá-lo de lado?”, ao que Derek Chauvin respondeu que não, porque naquela posição ele não poderia fugir. O agente Lane mostrou alguma preocupação com o estado de Floyd: “Estou preocupado que ele possa estar com alucinações ou assim” ao que Chauvin respondeu: “É por isso que o temos de bruços”. Chauvin e Kueng ainda levantaram a mão direita de Floyd, mas nenhum dos três agentes saiu da sua posição (um no pescoço, outro nas costas e o último nos pés).
20:244>
Floyd deixa de se mexer e falar
Às 20:24, cinco minutos depois de ter sido deitado ao chão e imobilizado pelos três agentes, Floyd deixou de se mexer, depois de os movimentos e sons que emitia terem vindo a diminuir durante esses cinco minutos. “Às 20:25 horas o vídeo parece mostrar Floyd a deixar de respirar ou falar”, pode ler-se no processo. Nessa altura, o agente Lane diz que quer colocar Floyd de lado, enquanto o agente Kueng procura os sinais vitais no pulso direito e diz que “não os consegue encontrar”. Ainda assim, nenhum dos três agentes saiu da posição em que estava.20:25
Vídeo mostra Floyd parando de respirar
Só dois minutos depois, quando chega a ambulância e os paramédicos é que Derek Chauvin retira o joelho do pescoço de Floyd.
Eram 20:27 horas. Os três agentes estiveram cerca de nove minutos em cima de Floyd, sem mudar de posição ainda que tenham verificado que o homem já não tinha pulsação cerca de dois minutos antes da chegada da ambulância. George Floyd foi transportado na ambulância para o Hennepin County Medical Center onde foi declarado morto.
20:27
Chega a ambulância e Chauvin tira joelho do pescoço de Floyd
A autópsia a Floyd
A autópsia de George Floyd foi realizada logo no dia seguinte, a 26 de maio. No primeiro exame, realizado pelo médico legista, não foi possível “observar evidências físicas que suportassem asfixia mecânica” e o médico sugere que Floyd “morreu de parada cardiorrespiratória enquanto estava a ser contido pelos agentes da autoridade”. A autópsia revela que Floyd tinha aterosclerose (uma doença vascular crónica) e era hipertenso enquanto a análise toxicológica revelou a presença de “fentanyl e evidência de uso recente de metanfetaminas”. Segundo o médio legista, o efeito da contenção feita pelos agentes da polícia, as condições de saúde e a presença de drogas contribuíram para a morte de George Floyd.
O médico legista registou a causa da morte como “parada cardíaca complicada pela aplicação da lei, restrição e compressão do pescoço, concluindo que a causa da morte era homicídio”, pode ler-se no processo movido contra Derek Chauvin, que acrescenta ainda que além de Chauvin, Lange e Kueng subjugaram Floyd durante quase nove minutos quando “já não era necessária sequer força para o controlar”, considerando que a condição de saúde de Floyd se tinha “deteriorado”.
Oito minutos e quarenta e seis segundos
Segundo as contas feitas no processo, através da visualização das imagens das câmaras corporais de todos os agentes, Derek Chauvin teve o joelho em cima do pescoço de Floyd durante oito minutos e 46 segundos, dos quais dois minutos e 53 segundo já depois de Floyd estar inconsciente. O processo acrescenta ainda que a polícia é treinada e sabe que manter um “sujeito de bruços é perigoso”.
A descrição da noite de dia 25 e do resultado da autópsia a Floyd termina com a afirmação de que “o suspeito está detido”, referindo-se a Chauvin, mas não sem antes deixar claro que a detenção feita pelo agente Chauvin a Floyd na posição de bruços, “durante um período prolongado foi um fator substancial na perda de consciência de Floyyd, constituindo danos corporais substanciais e também a morte de Floyd”.